domingo, 19 de setembro de 2010

LIVRO "NEM CÉU NEM INFERNO" PARTE 15

Após algum tempo Ronove retornou com um estranho sorriso. O problema parecia resolvido, pois as Argos voltaram a funcionar e, pelo visto, nos aproximávamos do encontro com o Rei.
Durante a jornada pela cidade à “sci-fi*”, eu, com minha rabugice inata, tentava repuxar algum sentimento de morbidez, algo impossível e, impensável, aliás, quem ousaria pensar com tanto entretenimento através da janela. A cidade era uma ilusão. E das boas. Confesso até reviraria meus bolsos em busca de algum trocado para consumir naquele paraíso, reviraria, afinal, estava sem bolso, trajado com um vestido - azul-bebê.
Subitamente passamos a trafegar sobre uma ponte que dançava ao ritmo tenebroso do mar de lava que estava mais abaixo. A extensão era, definitivamente, incalculável, pelo menos para mim, que não era japonês. O cheiro que emanava era dos melhores, enxofre. Puro enxofre. Um cheiro demoníaco pelo qual eu mantinha certa obsessão - desde criança, segundo relatos dos meus progenitores.
Aquele cheiro sim, conseguiu me preencher de tal forma, que eu passara a me sentir em casa, ou melhor, meu primeiro lar.
-Tapem os ouvidos! Ordenou Ronove.
Todos cansados de ouvir tanta ordem daquele “demoninho” à sete anões que, simplesmente, ignoramos, logo, o som dos tambores que anunciavam a chegada aos aposentos reais, nos inundou com uma sensação pavorosa de malevolência. Imensos tambores eram agredidos por imensas criaturas cor de pele anêmica mixada com tons arroxeados e o vermelho-sangue que escorria pelos braços voluptuosos. As faces eram cobertas e enegrecidas por extensos fios capilares encharcados com suor. Para um bom ouvinte, o som onomatopéico das correntes que os prendiam àquela mortificação, poderia alterar a melodia macabra, ou seja, permanecia intacta em meus ouvidos. Posteriormente, Ronove nos explicou que o som ao penetrar nos ouvidos dos demônios, os enfraquecia momentaneamente e, além disso, as ondas sonoras serviam como um sensor, pois rebatiam em qualquer matéria em movimento, fazendo caminho regresso até o rei, que então, notava a presença do que quer estivesse adentrando o palácio.
-Desçam todos imediatamente!
Parecíamos ter chegado, então, ao Palácio Real. Uma pequena porta de madeira no canto direito, contrastava com a ostentação do lugar que era envolto por altíssimos muros de ouro. O que parecia ter sido um jardim jazia ao redor e um caminho de pedras vulcânicas nos trilhava até a, aparentemente, única entrada. Ronove nos calou com um feitiço que anulava nossa voz e então, guiou-nos até a porta.
-Não toquem em nada monstrinhos! Alertou ao notar a nossa ânsia para começar a palpar tudo ao redor.
Antes que Ronove batesse à porta pela terceira vez, ela se abriu, e uma voz suave e maternal nos deu as boas-vindas.
-Makeda! Ronove se dirigiu à mulher mais bela que todos vimos, até então, a julgar pela nossa expressão de completa redenção e surpresa.
-Não me chame assim na frente das crianças, Ronove!
-Me desculpe, essa é a Rain...
-Deixe comigo! Prazer, eu sou a Rainha de Sabá, mas podem me chamar de Balkis.
-...
-...
-Ora, mas que falta de polidez, vocês não vão se apresentar? Frustrada, a Rainha se dirigiu à nós.
-...
-Nossa! Mas que cabeça, me desculpa Make...Balkis, eu os enfeiticei para não falarem!
-Tudo bem, então. Ato bem pensado Ronove, Aleister está ocupadíssimo e não deseja ver, ou, muito menos ouvir alguém.
-Foi o que pensei...
-Como assim?!
-Ah! Não é nada Ma...Balkis. O Rei sempre está ocupado, por isso, eu pensei em enfeitiçá-los. Para não atrapalhá-lo com barulhos infantis.
-Entendo! Pode ir agora Ronove, daqui pra frente quem cuida deles sou eu. Obrigada por trazê-los até aqui.
-Tudo bem, mas e as almas que eu iria ganhar em troca pelo serviço?
-Estão todas no poço da escuridão, Môtu já está avisado. Agora, saia daqui!
Ronove com alívio explicitado ao se livrar de nós, se dirigiu a argo e retornou à cidade.
A Rainha apresentou o que era, segundo ela, o Templo de Aleister III. No saguão de entrada, dois pilares sustentavam o teto de ouro e uma piscina revestida com piso de bronze e medidas absurdas ficava ao centro e, no centro da piscina uma cabeça de bronze refletia a luminosidade da água. Embaixo da cabeça se via escrito: “Solomon”.
Nas paredes, imensas cortinas pingavam sangue e alguns candelabros iluminavam o corredor pelo qual passamos ao sermos levados até um quarto pequeno com alguns colchões espalhados pelo chão. A Rainha disse que ali poderíamos descansar e, nos proibiu de sair daquele cômodo até que o Rei pudesse nos ver.
Após a saída dela, todos dormiram feito pedra, menos eu. A minha cabeça ainda tentava solucionar um enigma que corroía minha mente: Por que Balkis me parecia tão familiar?

*SCI-FI: Science-Fiction(Ficção Científica).

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